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Angola

Então, ainda não falei da rainha, Cesária Évora? Tive a sorte de assistir a* um espetáculo dela em… hum… 2001, se não me engano. Naquela altura, não falava nem uma palavra de português mas mesmo se falasse não me teria ajudado porque a maior parte da obra dela está em Crioulo Cabo-Verdiano. Fomos com a tia da minha esposa. A minha esposa nasceu no Cabo Verde e viviu lá durante os seus primeiros anos, antes da família dela ter voltado para a Madeira. A cantora tinha uma maneira muito relaxada de se apresentar na sala de concertos. Não parecia ser muito animada. Só cantou de pés descalços**. Havia uma mesa no centro do palco e, durante o seu intervalo, a banda continuou a tocar enquanto ela sentou-se numa poltrona, acendeu um cigarro, deitou um pouco de vinho num copo*** e ficou tranquila, nem sequer olhando o público durante 3 ou 4 minutos até à abertura da próxima música.

Queria fazer uma tradução da sua canção “Angola”, que é empolgante, mas claro que preciso da ajuda de um português que entenda o crioulo. Roubei as letras deste site, mas acho que o homem que fez esta tradução parafraseou um pouco. Por exemplo, aquela primeira linha tem uma conjugação do verbo “viver”, sem dúvida. Acho que ela diz “Essa vida boa que os senhores estão a viver”. Existem vários sites online onde se explicam estas línguas parecidas com o português padrão – por exemplo, aqui está a descrição de “nhôs” no Infopedia . E tenho as minhas dúvidas sobre a interpretação de “Ami nhos ca ta matá-me” porque parece-me tão descabido no contexto… mas tenho de confiar no tradutor porque ele afirma que é fluente!

A música é linda. Eu não sei nada de teoria da música e se calhar, estou completamente errado, mas parece-me influenciado pela música do Brasil, com um ritmo sincopado que me lembra o**** Samba, mas é mais do que só uma cópia: muito mais. Tem um som único, e a voz dela é… Ouso dizer “ouro sobre azul”? O efeito da voz e da música é esmagador!

*I need to smack myself in the head with a frying pan a few times till I remember to put the “a” after “assistir”

**I’m only talking about the concert but I could easily have said the same about her career.

***I really screwed this sentence up – I tried to use the verb “derramar”, which isn’t even the right verb (it means spill) but then I managed to get it even wronger and wrote “derrubar”. I think deitar is the right verb even though it sounds weird – I usually associate it with laying something down or chucking it away. I also wanted to express the idea that she poured out a few sips worth, but that didn’t go any better. Hopefully this works. the easy way would be to say “encheu um copo” because why wouldn’t you want to fill it all the way up? But I was trying to be more specific than that. Sigh. This seems like a very basic thing to be confused about when I’m meant to be at C1 level.

****Not “do Samba”: “it reminds me of” doesn’t have de, whereas “i remember” does – so the preposition use is pretty much the opposite of english, really!

CrioulaPortuguêsInglês
Ess vida sabe qu’nhôs ta vivê
Parodia dia e note manché
Sem maca ma cu sabura
Angola angola
Oi qu’povo sabe
Ami nhos ca ta matá-me
‘M bem cu hora pa’me ba nha caminho
Ess convivência dess nhôs vivência
Paciência dum consequência
Resistência dum estravagância
Essa vida boa que vocês têm
Paródia dia e noite até de manhã
Sem mágoas, com alegria
Angola, Angola
Oh que povo alegre
A mim não me matam
Venho com hora para partir
A convivência na vossa vivência
Paciência duma consequência
Resistência duma extravagância
That good life you’re living
Parodies, day and night, until morning
Without pain, but with happiness
Angola, Angola
Oh what a happy people
They don’t kill me
I come when it’s time to be on the way
The way living together is a way of life
Patience of consequence
Resistance of extravagance

Thanks to Cristina of Say it in Portuguese for correcting the text description above the video.

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A Lusofonia

A lusofonia

A Lusofonia é o nome dado aos territórios mundiais onde se fala português. Mas para além disso, existe uma ideia de uma comunidade de povos unidos por uma história e um idioma partilhada*, mesmo que muitas pessoas vivem noutros países. Talvez o melhor encapsulamento desta ideia deja uma citação de Fernando Pessoa “Minha Pátria é a Língua Portuguesa”. Eu também sou cidadão dessa pátria, apesar dos erros que faço!

O autor e poeta Angolano conhecido como “Ondjaki” deu a sua opinião sobre a lusofonia no festival internacional de literatura em 2014. Para o escritor, a lusofonia é uma comunidade de pessoas lusófonas de qualquer país, sejam de onde forem**, mas às vezes, ouve pessoas a falar como se a lusofonia fosse apenas os cinco países africanos. Perguntou porque é que se fala dele e dos outros escritores africanos como membros da “lusofonia”*** mas Saramago nem por isso. Tanto quanto eu entendo, o seu ponto de vista não é uma acusação de racismo ou de colonialismo. Afirma, isso sim, que somos todos iguais perante a língua.

Identifico-me muito com esta visão, como cidadão dum outro país expansionista: os países onde se fala inglês são os países que antigamente “pertenciam” ao nosso império e embora o passado seja o passado e o presente seja o presente, a comunidade linguística deve servir como um lembrete da nossa história partilhada, e é isso que é a chave para a cooperação no futuro.

CPLP

Lado ao lado com a ideia intangível da lusofonia, existe uma entidade política que representa a zona lusófona. O título dela é Comunidade dos Países da Língua Portuguesa (CPLP) e foi fundada em 1996. Tem o propósito de aprofundar a amizade e a cooperação entre os países lusófonos. Para além dos objectivos económicos (desenvolvimento, crescimento, negócios internacionais), esta amizade consiste em ligações culturais e desportivas. E sem dúvida a saúde da língua em si é importante, portanto a difusão do conhecimento de português faz parte da sua missão.

A organização é regida por um secretariado executivo cujos planos são concretizados por ação a outros níveis da estrutura governativa: o Conselho dos Chefes de Estado,**** e os conselhos dos ministros dos negócios estrangeiros e relações exteriores. Por seu turno, estes conselhos devolvem responsabilidade aos encontros mensais do comité de concertação permanente.

A CPLP tem uma presidência rotativa com um mandato que dura dois anos, para não ser dominada por um único país. Mas apesar disso, há quem afirmem que a organização é dominada pelo país mãis desenvolvido (Portugal) e o maior, e mais rico (Brasil). Da mesma maneira, a Comunidade de Nações (“Commonwealth”) que é a estrutura equivalente da “Anglosphere” (basicamente, a anglofonia) é alvo de críticas de quem veja todas as uniões intergovernamentais como símbolos do passado colonialista. Para mim, tais desequilíbrios são quase inevitáveis, mas não é motivo de desespero. Deve funcionar, isso sim, como um estímulo a trabalhar juntos para eliminar desigualdades e erguer os mais fracos ao patamar dos países desenvolvidos. É esse o sonho.

*I wrote “Compartilhado” in a couple of places but that’s a Brazilian thing and “partilhado” is more usual in PT-PT

** I wrote “sejam onde forem” thinking it meant “wherever they happen to be” but it was changed to “wherever they happen to be from”. I guess the reason for this was my poor verb choice. Sejam and Forem are both from ser, so you can use it in phrases havubg to do with where you are from since that’s a question of your identity. I probably should have written “estejam onde estiverem” since estar is the verb that deals with where you happen to be right now.

*** Talures kindly reminded me that there is another expression – PALOPs – which stands for Países Africanos de Língua Oficial Português, which covers this same group of countries. That’s definitely not what Ondjaki is talking about in the clip but it might be the origin of the confusion, I guess…?

**** The Oxford Comma is as much a pet peeve in Portugal as they are in the English-speaking world but I like them.