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A Noite – José Saramago

A Noite ' Saramago

A Noite é o… Hum… Sétimo Livro de Saramago que já li, mas é diferente dos outros porque é uma peça de teatro. A ação passa-se no escritório da redação do Jornal de Lisboa nos anos setenta. Durante o primeiro ato, conhecemos as personagens, os seus cargos na empresa e as suas atitudes face ao governo de Marcelo Caetano. Um rádio está a tocar em* pano de fundo. Após algum tempo ouvimos “E Depois do Adeus” de Paulo de Carvalho, e começamos a perceber (se ainda não soubéssemos) em que noite especifica a peça é passa-se. Mais tarde ainda, a abertura do “Grândola Vila Morena” toca, o que causa o editor do turno de noite gritar “Desliga-me isso” e as luzes apagam-se, deixando o palco na escuridão.

No segundo ato, os jornalistas ouvem os boatos da revolução que está em curso, e tentam averiguar os factos. Uma clivagem abre-se entre os apoiantes do regime (principalmente os gestores, o editor e o diretor) e os socialistas (os trabalhadores na sala de impressão**, alguns jornalistas) que vêem com entusiasmo a ditadura a chegar ao fim.

O caos daquela noite é muito bem ilustrado, e o autor também retrata as divisões no país daquela época pelo exemplo de uma empresa cuja estrutura espelha a estrutura da sociedade. Para mim, o pior do livro é o desfecho: achei o coro de vozes demasiado óbvio, como se fosse uma propaganda, mas suponho que, da perspetiva de 1979 (quando a peça se estreou) era importante defender a liberdade, contra quem ainda tinha saudades da PIDE, e talvez seja por isso que às últimas 2 páginas da peça faltam uma certa sutileza visto por gente moderna!

*Em, not no. In background, not in THE background

**A Gráfica would also work for print room

Thanks as ever to Cristina of Say it in Portuguese for the help

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A Implosão – Nuno Júdice

O autor e poeta Nuno Júdice faleceu há pouco. Já li um livro dele, mas foi um livro de poesia e basicamente a minha perspetiva no mundo da poesia é barbárica, até no meu próprio idioma, portanto decidi comprar um romance dele. E que romance desafiante! Fui em busca de opiniões de outros leitores e encontrei um ensaio escrito por um académico da Universidade Católica de Portugal, que fala da “intertextualidade com alguns textos de Guerra Junqueiro ou O Marinheiro de Fernando Pessoa” e logo percebi que este texto podia estar fora do meu alcance!

Mas segui em frente e li o livro e gostei, apesar de tudo. Lembrou-me d’À Espera de Godot de Samuel Beckett, tendo como protagonistas duas pessoas num sítio irreal, com poucas outras pessoas. Falam de coisas que nem sempre fazem sentido: um caixão que talvez contenha armas, escondidas sob um cadáver que talvez seja também a pátria… Os dois têm um diálogo que anda em rodapés, tendo como assunto o seu passado na clandestinidade e a traição por sabe-se lá quem. Criticam o declínio do país e a desilusão das esperanças dos revolucionários do passado, e julgam que o Portugal de hoje, com os seus laços com a UE e as suas modernices é pouco melhor do que o Estado Novo, mas a atmosfera é tão absurda que é difícil (ou pelo menos eu acho difícil) entender o que o autor queria transmitir.

Nota-se que o ensaio fala da “geração de 70”, o que eu assumi significa “a geração que participou na revolução”. Mas enganei-me: A geração de 70 foi um movimento da década de 70 do século XIX. Pois… mais um assunto de mais uma pesquisa de mais um dia… Mas isto tudo alimentou o sentimento de estar perante uma obra cuja profundidade* não sou capaz de explorar!

*Depth, not depths. I translated too literally from english.

Thanks as ever to Cristina of Say it in Portuguese for the help

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Se Perguntarem Por Mim Digam Que Voei

Alice Vieira

Mais uma vez, virei a última página de um livro e pensei “Quem me dera ter desenhado uma árvore genealógica daquelas personagens” porque confesso que perdi o fio à meada muitas vezes e por isso não gostei da leitura tanto quanto os portugueses que lhe deram 4 ou cinco estrelas no Goodreads.

Alice Vieira escreve muito bem, e geralmente os livros dela são muito acessíveis. Talvez fosse por causa disso que não comecei com a devida cautela! Geralmente com tantos protagonistas eu pego num lápis e faço um diagrama das ligações entre eles*.

Se Perguntarem Por Mim Digam Que Voei” conta a história de várias mulheres que moram numa aldeia provinciana, que têm os seus próprios sonhos mas que vivem num ambiente opressivo. Existem alguns homens, mas assumem um papel menor. Também há um cheiro a bruxaria mas fiquei tão confuso que nem sequer tenho certeza de se magia existe no mundo do livro ou se era apenas uma expressão da imaginação delas. Eu sei, sou idiota.

Enfim, não faz mal. Talvez volte a lê-lo um dia.

*I originally made this feminine: tantas … elas, because the true protagonists of this are all wammens, but I suppose since it’s talking about books in general, and most books will have da mens in it, I ought to make it masculine again

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Doze Reis e a Moça no Labirinto do Vento (Marina Colasanti)

Doze Reis e a Moça no Labirinto do Vento

Este livro é uma coleção de contos que têm a atmosfera de contos de fadas: as personagens são reis, princesas e feiticeiras, entre outras. Mas apesar destas histórias curtas terem o mesmo tom dos contos infantis, há algo mais escuro nos temas das narrativas. E a estrutura da linguagem e a escolha das palavras dão um ar muito mais “adulto” à coleção.

A autora é uma brasileira muito premiada, mas o meu exemplar foi publicado pela editora Tinta de China para leitores portugueses. Como sempre, o livro, como objeto físico, é muito bonito, com capa dura cantos redondos e folhas grossas. Até cheira bem.

Thanks to Cristina for the corrections

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Uma Família Madeirense – João França

Here’s a review of the book that’s been doing my head in for a while. Not recommended for beginners, but very interesting if you’ve got the spoons to stick with it to the end. Special bonus, to encourage you to read the footnotes, there is a free book giveaway in one of them today. Oooh! Exciting!

Uma Família Madeirense

Uau, este livro surpreendeu-me! Mais sinceramente, deu-me água pela barba: havia tantas palavras desconhecidas, tantos regionalismos e tantas personagens que me senti desesperado. Quase desisti, mas com ajuda do dicionário… e um mapa e uma árvore genealógica e a Wikipédia… consegui, por fim*, entender tudo.

A história desenrola-se entre duas épocas: 1936, durante a Revolta do Leite, um protesto popular sobre um decreto-lei que estabeleceu um monopólio na produção de laticínios nos primeiros anos do Estado Novo e 1975, durante o assim chamado “Verão Quente” que se seguiu à revolução e à queda do governo** de Marcelo Caetano. Como é óbvio, os protagonistas são os membros de uma família, encabeçada pelo Comendador Bonifácio de Oliveira, um homem conservador, monarquista e, acima de tudo, teimoso, que rejeita o seu amigo*** por não concordar consigo sobre a implantação da República.

O livro é curto, tendo pouco mais de 130 páginas, mas o autor consegue incluir**** grande parte da história do país: a transição da monarquia para a República que depressa tornou-se ditadura, e a restauração da liberdade por um golpe de estado, que parecia prestes a dar lugar a mais uma ditadura. Entretanto, os inimigos do estado desaparecem, emigram ou são presos, e a hipocrisia e o conservadorismo da burguesia madeirense são colocados em foco, destacados pelos acontecimentos no palco nacional, mas até eles têm de mudar ao longo das gerações.

Adorei o desenlace. Pareceu-me a conclusão perfeita para esta telenovela literária.

*I wrote “afinal” here and was challenged to explain why that was wrong but my brain is broken so I’ll make that the subject of a future blog post. Anyway, the TL;DR is – that’s wrong!

**I originally wrote “que seguiu a revolução e a queda do governo” thinking like an english speaker, thinking yeah, transitive verb, “it followed the revolution”, but no, in portuguese it follows itself to the revolution. This is one of those grammatical structures that I think if only I understood why it seems natural to put words in that order I’d be a lot closer to thinking like a native.

***The name of the friend (and of the friend’s son who also plays an important role) is Meireles, so it’s sort of spooky that in between drafting this review and publishing it I got an email from another Meireles, Devin Meireles, who has just finished writing his own book about Madeira. Quite a coincidence! Anyway, I don’t know if this Meireles holds unacceptable views on the implantation of the republic like his namesake, whether he is in fact a “jacobino sem vergonha”, but what I do know is that his book, Finding Madeira, is available free on Amazon this week (17-21 December). So if that sounds like something you’d be interested in, have a look and if you like it, drop him a review on Goodreads.

****I used capturar here but that’s too much of an english expression.

Thanks again to Cristina of Say it in Portuguese for her very helpful corrections which I am too addled to understand fully right now but will hopefully make more sense in the morning.

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A Cancão de Lisboa

A Cancão de Lisboa com Vasco Santana

A Canção de Lisboa” é o primeiro filme feito por portugueses segundo o cartaz e o segundo, depois d’”A Severa”, segundo a Wikipédia. O realizador foi José Cottinelli Telmo, um arquiteto, artista e cineasta que colaborou com o Estado Novo em vários projectos, incluindo a Exposição do Mundo Português e as escadas monumentais de acesso à Universidade de Coimbra (o pior crime de sempre, na opinião da minha filha).

O filme conta a história de Vasco Leitão (protagonizado por Vasco Santana) que é inexplicavelmente sortudo: tem uma namorada linda e atrai a atenção de outras raparigas, apesar de ser pobre, gordo e pouco jeitoso.

Mas a sério, canta bem e é encantador, que provavelmente ajuda-o a engatar as raparigas. Ainda por cima, do ponto de vista dos espectadores, tem qualidades tipicamente portuguesas que permitem uma audiência nacional identificar-se com o protagonista.

Há, sem dúvida, muitas cenas engraçadas no filme (a minha favorita é quando o Vasco se arma em veterinário no jardim zoológico para ganhar dinheiro), mas não é o mais fácil de entender. Os sotaques daquela época soam diferentes (assim como os filmes ingleses dos anos 40 do século passado) e a qualidade da gravação antiga estraga os tons mais altos e torna mais incompreensível o diálogo. Portanto, ainda que o filme seja um dos mais populares de sempre, não é muito acessível para nós estrangeiros. Talvez tivesse sido mais fácil entender a remake* de 2016, mas este blogue tem os seus princípios. Não suportamos remakes nenhumas. O que será a próxima? Se tolerarmos uma versão da Canção de Lisboa com César Mourão, teremos de aceitar uma versão do Ghostbusters com elenco feminino? Nunca!

*Wikipedia says refilmagem but our survey says (*uh erghhhh*). Might be a Brazilian thing?

Thanks as ever to Cristina of Say It In Portuguese for the helpful corrections

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A Religião dos Livros – Carlos Bobone

A Religião dos Livros

Este audiolivro é um breve resumo do mundo dos livros: a paixão que os leitores sentem em relação às suas bibliotecas e as mudanças trazidas pela tecnologia: como sobreviverão os alfarrabistas face ao poder da Amazon?
Embora o foco do livro seja em Portugal, esta questão existe ao nível global, e o autor fala sobre, entre outras coisas, a famosa aldeia dos livreiros, Hay on Wye no país de Gales, que é um dos meus sítios favoritos.

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Passageiros em Trânsito – José Eduardo Agualusa (Opinião)

Este livro é um daqueles que consegui ler durante o Fim-de-Semana de pascoa. Os contos tem a ver com viagens, e pessoas fora dos seus países e (menos literalmente) fora das suas zonas de conforto.

Existem contos que são histórias completas mas curtas, com um começo e um desenlace e um enredo cheio de acção, como um romance encolhido ao tamanho de um artigo de revista. Convém dizer que os contos neste livro são exactamente o oposto! São mais descritivos e contêm menos desenvolvimento do enredo. A maioria consiste em retratos de pessoas ou de situações de três ou quatro páginas de extensão. O autor esboça estes cenários todos numa maneira bem nítida, portanto o livro lê-se bem. Li-o rapidamente, virando as páginas, conto após conto até ao fim.

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Winepunk

Acabo de ler um livro chamado Winepunk. Trata-se de uma compilação de contos de ficção cientifica baseados numa história alternativa de portugal. Nesta realidade imaginativa, a monarquia do norte (um movimento verídico que teve o seu inicio em 1919, depois da implantação da República Portuguesa) sobreviveu durante anos, ao contrario da monarquia histórica que foi esmagada dentro de umas semanas.

O título “Winepunk” tem origem na frase “Steampunk”, um género inglês de ficção cientifica com raízes no mundo da revolução industrial com máquinas alimentadas por carvão e vapor. Os autores brincam com várias espécies de geringonças tal como plantas vivas, robôs cuja* fonte de poder é plasma de uva e animais de estimação com ligações psíquicas aos seus donos. Não é cem por cento coerente porque cada autor tem a sua própria imaginação e o seu próprio estilo e às vezes, estes não têm semelhança o suficiente para concretizar um mundo literário no qual o leitor pode acreditar. Mas há contos divertidos. Acima de tudo, amei a contribuição do José Barreiros. Os dois do Rhys Hughes** também têm muito jeito. mas exemplificam bem a minha queixa com o projecto em si: os contos nem sequer mencionaram a monarquia de todo!

*Rookie mistake here. “Cuja” because it agrees with “fonte” not “robôs”

**Rhys Hughes é um escritor galês que mora em Lisboa. Ama portugal e já escreveu dois livros em português: “A História Universal de Infâmia” e “A Sereia de Curitiba”. Não tenho a certeza mas, pelo que sei, escreveu-os em português, e nem usou tradutor. Uma vez que tenho tentado escrever um conto em português, vejo este escritor como um herói e quero ser igual a ele.

Thanks to Natalia for the correction. There is some good stuff in english about this compliation on the Portuguese Sci-Fi Portal here and here, and you can see a decent review by a much better portuguese reviewer on youtube… um… I don’t think I’ll link directly but if you search for “aoutramafalda winepunk” or “books beers baby quarantena winepunk” you’ll find what you’re looking for.