
TFW Humberto Delgado é Assunto de um Questão do Quiz


Ontem, escrevi um texto sobre Humberto Delgado, o “General sem Medo”. Na mesma altura, os aderentes da outra ideologia extremista, o comunismo, alcunharam-no de General Coca-Cola, troçando dele por ser um fantoche da OTAN* e dos EUA.

Mas décadas antes disto, tinha havido mais uma história interessante sobre a bebida e a reação portuguesa ao capitalismo americano. A Coca-Cola foi lançada no mercado português em 1927. Naquela altura, Fernando Pessoa era um escritor comercial além de ser um poeta (ou melhor “além de ser muitos poetas”) e escreveu um slogan para a marca: “Primeiro estranha-se, depois entranha-se”**. É um bom slogan, mas implica algo sobre o produto cujo ingrediente principal era basicamente cocaína: era muito viciante. O governo de Salazar já pensava em proibir o refresco, mas o slogan confirmou a decisão. Foi banido durante o resto da época da ditadura e não foi vendido no país até 1977, quando Mário Soares, então primeiro ministro da República, negociou um empréstimo de 300 mil dólares.
A cronologia é confusa: uma página tem uma imagem do Soares a apertar a mão do Presidente Ronald Reagan, mas Reagan passou a ser presidente em 1981. Os motivos também são confusos. Uma página deu impressão de Pessoa ter tentado derrubar o governo Salazarista com o slogan. Duvido disso. Suspeito que a maneira de contar a história depende do escritor e da sua opinião de Pessoa e do capitalismo americano. Pessoa escreveu um slogan para a marca. Então, isto significa que ele gosta da bebida? Ou que foi um ato de sabotagem? Salazar baniu-o porque era anticapitalista e queria proteger as empresas nacionais? Ou porque foi um capitalista que cedeu sob pressão do poeta? Os comunistas falam mal da Coca-Cola porque é uma ferramenta do capitalismo ou porque preferem o Compal?
*OTAN is NATO in portuguese but NATO is often used just because that’s the standard way of writing it and, after all, it’s an international organisation.
**How to translate this? The “-se” pronouns effectively make the verbs able to be used without an object, and the two verbs are cognates of “estranges” and “entrances”. First it estranges then it entrances… Hm, it doesn’t sound idiomatic does it? First it seems weird, then you’re hooked. Something like that is probably better.

Humberto Delgado foi um marechal da Força Aérea, conhecido como “o general sem medo” por causa da sua coragem na oposição ao regime Salazarista. Mas a sua carreira seguiu um caminho rumo de altos e baixos* da cena política do século XX. O marechal participou no movimento militar de 1926 que suplantou a República parlamentar com uma ditadura militar que daria lugar ao Estado Novo poucos anos depois. Delgado participou neste movimento com entusiasmo, criticando tanto os republicanos quanto os monárquicos, apoiando as políticas do novo estado e escrevendo um livro sobre (A) Pulhice do Homo Sapiens e a necessidade da liderança de Salazar. Elogiou Hitler, não só no início do seu regime, mas durante os primeiros anos da Segunda Guerra Mundial.
Mas, no decorrer daquela guerra, a simpatia do marechal passou para os Aliados. Eh pá, mais vale tarde do que nunca. Apesar do Estado Novo ser neutro durante a guerra, cooperou, até certo ponto, com os aliados. Humberto Delgado representou Portugal em vários projetos, incluindo a instalação das bases áreas nos Açores que ainda existem nos dias de hoje.
Após a guerra, continuou a sua obra em vários cargos no governo, no serviço diplomático e na OTAN.
Em 1958, candidatou-se nas eleições contra o candidato do regime, Américo Tomás, tornando-se o foco da oposição ao Estado Novo. Recebeu um nível esmagador de apoio público, mas surpreendentemente perdeu, tendo recebido apenas 23% dos votos, o que levantou suspeitas de fraude eleitoral. No ano seguinte, Delgado pediu asilo político no Brasil por causa das ameaças dos seus inimigos políticos.
Convencido de que o regime não poderia ser derrubado por meios democráticos, o marechal deu apoio à ação revolucionária, incluindo a Revolta de Beja em 1962. Tentou regressar ao país em 1965 mas foi assassinado pela PIDE perto da fronteira com Espanha**. Foi enterrado em Espanha onde permaneceram os seus restos mortais até 1975, quando foram transferidos para o Cemitério dos Prazeres em Lisboa.
*The highs and lows – this is a fixed expression.
**It was pointed out that, since Portugal only has one country on its border I could drop the “com Espanha” here. I’ve left it though, because I’ve said he was in Brazil. I guess it removed ambiguity about whether he was killed early in his journey, after setting off from a border town in Brazil or something, but this is good advice in most scenarios, I think.